29 junho, 2012

GERENCIAMENTO DE OBRA


A obra atrasou, e agora?


Os atrasos na conclusão de obras, cada vez mais frequentes no segmento residencial, po­­dem desencadear uma série de prejuízos para empresas da construção civil. Se não há como se proteger de todas as consequências, algumas medidas corretivas podem ajudar a reduzir os estragos.
Na obra 

De acordo com Roberto de Souza, diretor presidente do CTE (Centro de Tecnologia de Edificações), as perdas se agravam a cada mês de extensão no cronograma. Quando os desajustes no prazo começam a dar os primeiros sinais, Souza recomenda a formação de uma força tarefa com profissionais qualificados para diagnosticar a origem do problema. "É preciso colocar uma lupa em cada obra. Medidas generalistas não resolvem", informa o diretor. Identificadas as causas, a equipe deve montar um plano de ação emergencial que entre no detalhe da programação da obra, semana a semana. "Pode ser que não se recupere o atraso, mas se você não fizer nada, um atraso de três meses pode chegar a seis meses ou um ano", diz. 

Segundo Luiz Fernando Castilho, gerente de orçamentos da Sinco Engenharia, o replanejamento dos serviços deve ser feito a partir de novos parâmetros de produtividade, levando em conta a capacidade de fornecimento do mercado. Castilho levanta a possibilidade de se abrirem novas frentes de trabalho para executar simultaneamente serviços que não dependam um do outro. "Às vezes temos contratado mais de um empreiteiro para o mesmo serviço. Se o fornecedor de gesso, por exemplo, não consegue aumentar a equipe, eu coloco dois empreiteiros, um em cada frente de trabalho", relata. No entanto, a medida implica aumento de custos e exige mais mão de obra em um mercado onde esse recurso já é escasso. "É um exemplo a ser estudado. A solução não é simples e às vezes você pode até perder dinheiro", adverte. 

Outra medida de contenção é antecipar as contratações com fornecedores e manter um controle mais rígido sobre todas as etapas construtivas, evitando assim que os atrasos se proliferem. "Se tenho gesso para daqui a um mês, tenho que ficar em cima do departamento de suprimentos para saber se já está contratado, quem é a equipe, se posso mostrar ao empreiteiro quanto ele precisa fazer por dia", exemplifica Castilho. Mas mesmo com todo o empenho para elevar a produtividade, o diretor técnico da Tecnisa Fábio Villas Boas afirma que é difícil conter as perdas financeiras. "O que você pode fazer é atuar ao longo do processo para diminuir o atraso, mas depois que o atraso ocorreu, você tem pouca margem para resolver", afirma. "Quando você está atrasado, acaba pagando hora extra, assumindo custos maiores para conseguir um insumo mais rápido, acaba tendo mais ônus para reduzir o atraso." 
Relacionamento com o cliente 
Se na área financeira há pouco o que fazer, no relacionamento com o consumidor alguns cuidados podem até afastar eventuais litígios, evitando perdas ainda maiores com indenizações aos clientes. De acordo com José Geraldo Tardin, presidente do Ibedec (Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo), o fator que mais agrava a insatisfação do consumidor não é apenas o atraso, mas, principalmente, o descaso das empresas na comunicação com os clientes: "A principal reclamação é de que o consumidor não tem qualquer feedback das empresas. Elas colocam no contrato uma carência de 180 dias e não justificam esse atraso". (Veja no boxe a discussão sobre a legalidade desse prazo.) 
Entre os clientes da ABMH (Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação), a situação é parecida. "As respostas, quando vêm, são genéricas. Temos clientes que já tiveram a data de entrega prorrogada quatro vezes", conta Lúcio Delfino, diretor da entidade. "O atraso, para a maioria das pessoas, é compreensível. O principal problema é a falta de retorno da empresa. Essas pessoas vão fazer a propaganda o mais negativa possível da construtora." Ambos recomendam que a construtora explique, com franqueza e antecedência, os motivos do atraso aos consumidores. Isso evita surpresas desagradáveis na véspera da entrega, quando o consumidor já se planejou para mudar para a casa nova. Segundo comenta Fábio Villas Boas, "se você avisar com muita antecedência que está enfrentando problemas e que provavelmente o prazo será alongado, apesar de não ficar satisfeito, o cliente tem tempo para se preparar e, em geral, entende que a empresa foi transparente". 
Se a sua empresa não prevê nos contratos o pagamento de multa aos compradores em caso de atraso, é recomendável que se ofereça também alguma compensação aos clientes. Segundo Lúcio Delfino, "sai muito mais barato do que pagar uma indenização" e, em geral, ajuda a prevenir brigas judiciais. As associações de mutuários aconselham os clientes a enviarem uma notificação extrajudicial à empresa antes de apelar para o Judiciário. Não é preciso esperar a notificação para agir, mas uma vez que a empresa foi notificada, essa é uma excelente oportunidade para se propor um acordo amigável. José Geraldo Tardin conta o caso de uma construtora que, após a notificação, ofereceu a troca do piso de cerâmica por porcelanato, além de melhorias nos banheiros. "O cliente ficou supersatisfeito e recebeu um imóvel com acabamento melhor pelo mesmo preço", afirma ele. Outra empresa ofereceu ao cliente o registro, a escritura e o ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis) gratuitos - o custo era de R$ 6 mil, segundo Tardin. "Tudo isso, para a construtora, é mais barato e não causa desgaste à imagem", conclui. 
Prazo de carência: é seguro? 

Uma questão que divide opiniões é a adoção do prazo de carência nos contratos de compra e venda: um período de tolerância que pode se estender a até 180 dias a partir da data de entrega. Construtores defendem que a carência é indispensável devido à complexidade do desenvolvimento de uma obra. O advogado Edwin Britto, membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil), justifica: "Pode haver algum problema de fundações, algum ajuste econômico, atrasos no financiamento. Há uma série de fatores imprevisíveis inerentes ao próprio empreendimento". Por essa lógica, os atrasos começariam a ser contados apenas após o vencimento da carência. No entanto, as associações de mutuários entendem que essa prática é abusiva, pois quebra o equilíbrio contratual assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor. 

"Se a construtora tem o direito de atrasar a entrega em 180 dias, o comprador também deveria ter o direito de atrasar o pagamento das parcelas pelo mesmo período", argumenta Lúcio Delfino, diretor da ABMH. Há ainda quem alegue que a carência só pode ser utilizada se justificada com caso fortuito ou de força maior, como defende José Geraldo Tardin, presidente do Ibedec. De acordo com os entrevistados, não há lei que regulamente essa questão. Mesmo a interpretação do Judiciário é divergente. "Alguns juízes entendem que os seis meses são ilegais. Outros, afirmam que se o cliente assinou o contrato aceitando a dilatação do prazo, ele não tem o que requerer", relata Marcelo Segredo, presidente da ONG ABC (Associação Brasileira do Consumidor). 

O fato é que, em um processo judicial, caso a decisão seja favorável ao consumidor, o construtor pode ter o prazo de carência anulado e, nesse caso, responderá pelos danos causados desde a data original de entrega. Diante do imbróglio jurídico, o mais prudente é sempre comunicar o atraso aos clientes com antecedência, ainda que a empresa não ultrapasse o prazo de carência. Os entrevistados garantem que muitos consumidores respeitam o que está acordado em contrato. Tudo o que eles precisam é de uma comunicação mais eficiente

FONTE:revista.construcaomercado.com.br 

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